Tô velha pra isso aqui,
um grito pixelado de quem sobreviveu ao Orkut e agora precisa lidar com Labubu, guerra e separação de subcelebridades
Lá pelos anos 2000, a internet era uma criatura esquisita e tímida.
A gente acessava escondido, ouvia o barulho demoníaco do modem discado e sentia frio na barriga ao abrir o Orkut. As comunidades eram tipo:
“Eu odeio acordar cedo.”
“Não sou obrigada.”
“Odeio calça Saruel.”
E tava tudo certo. Era uma internet mais burra, mais lenta e, por isso mesmo, muito mais saudável.
Eu fui usuária da internet quando ela ainda tinha vergonha de existir.
Vivíamos de MSN, Flogão, e scraps escritos com emoção como se fossem cartas de amor.
A internet era feia. Mal feita. Confusa.
Mas ela não queria nos destruir ainda.
Hoje, ela virou uma rave sensorial em looping infinito, regada a vídeos com voz de IA, uma overdose de trends e notificações que pulam no nosso cérebro como pipoca de ansiedade.
Agora, em 2025, eu acordo e sou recebida com um soco de pixels na cara:
• Zé Felipe se separou. (e eu com isso????)
• CPI das apostas. (lavagem de dinheiro versão reality show)
• Labubu é um demônio disfarçado de brinquedo colecionável. (?)
• Gente brigando nos comentários por causa de uma boneca de vinil com cara de quem fuma Derby escondido. (sem comentários)
• Influencers ensinando a ganhar mil euros por dia com um e-book em PDF ou dublando vídeo no Kwai. (e tem gente que acredita)
• E no meio disso tudo… guerra. Real. De míssil, de sangue, de gente morrendo. (e parece que ninguém se importa com o que é de fato importante)
Enquanto isso, modinhas são jogadas na timeline como arroz em casamento:
Tem quem colecione bonequinho com cara de gremlin fashion achando que tá investindo em arte.
Tem quem ache que usar a mesma calça wide leg e fingir que leu A Arte de Amar te faz profundo.
E eu?
Eu tô presa num escritório belga, com um ar-condicionado meia boca, derretendo num verão aleatório que não fazia parte do pacote Europa™. Tentando terminar uma planilha enquanto minha cabeça frita com excesso de informação e notificação push.
Sinto que todo dia eu queria ver menos.
Saber menos.
Sentir menos.
Não porque eu quero ser alienada.
Mas porque essa overdose sensorial que chamam de "vida digital" tá me deixando burra, cansada, e com vontade de viver numa fazenda com wi-fi limitado e geladeira com ímãs bregas.
E não me venha com:
“Ai, mas você viu o que o famoso X falou?”
Darling, eu nem sei quem é o famoso X.
Quem são essas pessoas? De onde vieram? Por que estão sempre se separando, gravando stories chorando ou vendendo curso?
Por que minha cabeça armazena o nome de celebridades que eu nunca procurei, mas esquece onde deixei a chave de casa?
Eu, que nasci em 95, vi essa transição toda acontecer.
Do MSN com nicks passivo-agressivos pro TikTok que tenta me enfiar goela abaixo um planner cor de salmão e uma rotina matinal que envolve acordar às 5h pra meditar e correr enquanto o sol nasce.
Gente, eu só queria paz.
E talvez um croissant.
Tô velha pra isso.
Velha no melhor sentido:
Do tipo que sabe quando tá sendo manipulada.
Do tipo que sente saudade de quando a internet era inútil, mas não insuportável.
Do tipo que quer apagar tudo, mas antes precisa terminar um e-mail do trabalho e fingir que não está à beira de um colapso de serotonina.
Hoje, entre um job mal pago e outro, penso seriamente em deletar tudo.
Apagar o Instagram. Mandar o TikTok se foder.
Jogar o celular no rio mais próximo e abrir uma papelaria artesanal numa vila francesa onde ninguém fala de algoritmo e todo mundo tem tempo pra tomar chá.
Mas não. Eu volto.
Claro que volto.
Porque a gente foi treinado pra voltar.
Falando em voltar…
Às vezes eu queria só abrir o MSN, colocar um status misterioso tipo “. . .” e ouvir Evanescence enquanto escolho o tema da minha página no MySpace.
Mas não posso.
Então escrevo esse texto.
Como quem joga uma garrafa no mar, ou melhor, num oceano de TikToks, teorias absurdas e modinhas sem alma.
Talvez alguém leia e sinta o mesmo.
Talvez a gente funde um clube.
O Clube do Ranço Contemporâneo™.
Onde ninguém segue modinha.
Todo mundo odeia o Labubu.
E o único algoritmo que importa é o da nossa sanidade.
Com senha pra entrar, playlist anos 2000, e o sagrado direito de não se importar com absolutamente nada.
Nos vemos lá.
Traz seu sarcasmo, seu bom senso, café… e repelente de trend.
O mundo já tá lotado de coisa inútil.
By:@Camilosca95
Órfã do Orkut. Sobrevivente do algoritmo dos horrores.
Estamos juntas, também estou muuuito velha pra tudo isso. Não sei e nem quero saber dos pseudo-famosos, e me preocupo com essa geração, seus cérebros estão sendo destruídos. Me adiciona no Orkut??? hahhahahahaha